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  • A demonização do amor

    Não me levem a mal, mas o AMOR é o sentimento que mais sofre discriminação, no mundo moderno. As diversas formas de ideologia, os múltiplos gêneros, o feminismo, a individualidade exacerbada, o narcisismo, o culto excessivo ao corpo, a instantaneidade das relações, tudo isso extirpa o AMOR na sua origem, não permitindo que ele floresça, quiçá que ele exista. Afinal, como você vai viver para alguém, se há um mundo de oportunidades te esperando lá fora! Todos nós vivemos em uma sociedade, na qual o que se persegue é o tripé dinheiro, sucesso e poder. A tudo isso, vieram aliar-se a obsessão estética, a busca de modelos a serem imitados e do prazer. O amor, pobre coitado, tornou-se um item desprezado, no fim dessa lista de atributos, que as pessoas lutam para conquistar, mal dando-se conta de que estes não lhes trarão a famosa FELICIDADE. Porque o amor não pode ser tratado como mais um atributo. Ele também não é um sentimento. O AMOR É, NA VERDADE, A FIRME DISPOSIÇÃO DE SEGUIR AO LADO DA PESSOA ESCOLHIDA. ATÉ O FIM. HAJA O QUE HOUVER. Ué, então peraí, tudo que aprendemos sobre o sentimento AMOR é uma falácia: sim e não. Em verdade, existe mesmo a idealização romântica do amor, a tendência a buscar o frisson, a magia, o tremor de mãos e o frio no estômago, que a sensação de desejar alguém desperta em nós. Isso outras emoções podem nos trazer. Como uma grande vitória. Um ganho financeiro. O alcance de uma meta. A medalha em um esporte. A conquista de um árduo objetivo. Mas, somente a ATITUDE AMOROSA, a FIEL DETERMINAÇÃO DE AMAR, pode afastar os dias nebulosos, o peso das doenças, a malcriação de um filho, a exaustão do fim do dia, as perdas da vida. Pergunte à mãe desse filho desobediente, se ela é capaz de amá-lo menos, quando vai dormir. Pergunte ao esposo devotado se ele abandonará sua esposa, em um caso de doença grave. Ou a uma família unida se, nos dias difíceis, eles deixam de se querer bem. A resposta será negativa. Porque o verdadeiro amor é essa determinação de, em qualquer circunstância, poder doar-se, entregar-se, consumir-se pelo ser amado. De perdoá-lo. Ampará-lo. Ajudá-lo. Ser seu Norte e seu melhor amigo. Então, evidentemente, em um mundo no qual tudo é consumível, tudo pode ser adquirido pelo dinheiro ou conquistado pela força bruta, pelo poder e pela influência, não há como levar-se o AMOR a sério. Se as pessoas estão apaixonando-se pelas outras por seus dotes ou atributos exteriores, como carro, dinheiro, status, sucesso, corpo, emprego e tantos outros, como seriam elas capazes de manter uma fiel determinação de permanecer, ao lado de seus objetos de desejo, quando estes nada mais tivessem a oferecer-lhes… Mas, ao mesmo tempo que é possível entender isso, é necessário que se compreenda algo muito mais profundo, cuja ausência, no mundo moderno, está destruindo a HUMANIDADE das pessoas, transformando-as em mercadorias ou seres robotizados, fazendo com que deprimam-se, sintam-se vazias, sem sentido para suas vidas, sem propósito existencial. O que está nos matando como civilização, impedindo que nos sintamos pertencendo a algo ou a algum lugar, deixando-nos à deriva sobre o que buscarmos, a fim de taparmos os buracos emocionais, entupindo-nos de remédios para dormir, ansiolíticos, suplementos, vitaminas, anabolizantes, estimulantes sexuais, procedimentos estéticos, pílulas mágicas e o que mais houver na indústria estético-farmacêutica, ou entorpecendo-nos com drogas e sexo fácil é: NÃO EXISTE VIDA COM SENTIDO, SE NÃO NOS DOARMOS PARA ALGUÉM. Esqueçam toda a baboseira que lhes foi ensinada, de que a mulher só é feliz se competir em igualdade de condições, o homem só é realizado se sair com todas as mulheres que conseguir, que a felicidade está em se bastar, que o importante na vida é ganhar dinheiro, ter um corpo sarado, fazer todas as noitadas possíveis e experimentar de tudo. Só existe a real felicidade quando podemos nos doar para alguém. Seja esse alguém seu companheiro, filho, parente, agregado, amigo – é preciso ser capaz de se entregar, do fundo da sua alma, para uma pessoa. Os sacerdotes entregam-se a suas igrejas, e é esse o mesmo raciocínio do amor interpessoal. Não há felicidade que não passe, necessariamente, por uma entrega pessoal. E não vale entregar-se para o pet! Ser pai de pet não valida essa determinação de amar, uma vez que a sua troca com o animalzinho jamais poderá igualar-se à troca humana, com seus inúmeros desafios, aborrecimentos, suas concessões, alegrias e realizações. É extremamente complexo, pois o mundo encaminha-se para um discurso do “eu me amo e me basto”, diante do qual poucos afetos verdadeiros pararão de pé. Sequer surgirão. Observe bem: está cada vez mais difícil encontrar alguém que queira se entregar e viver essa troca afetiva, tão complexa e única, que só o amor proporciona. Mas, acreditem: independentemente do que foi dito para vocês, o AMOR EXISTE, ELE VALE A PENA, ELE TRANSFORMA AS VIDAS DOS ENVOLVIDOS E FAZ COM QUE SE TENHA ESPERANÇA NO SER HUMANO. Só a espécie humana foi dotada de alma, sendo a única capaz de sentir. Os animais, independentemente do que se defenda, não possuem essa capacidade. Isso não sou eu quem diz, é a biologia. Os ANIMAIS CONDUZEM-SE POR INSTINTOS. E nós, humanos, estamos comportando-nos como eles, perseguindo o prazer o tempo todo! Portanto, chegamos a uma encruzilhada: ou as pessoas compreendem que é preciso buscar nos outros VIRTUDES (pois estas, uma vez adquiridas, não são perdidas, demonstrando de modo fiel quem o outro é), ou continuarão se frustrando a cada relação, interrompendo o romance porque o outro engordou, ficou pobre, perdeu o emprego, ficou careca, impotente ou algo do tipo. AMOR, meus caros, necessita de essência para prosperar. Escolher permanecer é algo que se constrói, dentro de nós. E é apenas lidando com o interior do outro, e não com suas posses ou com sua aparência, coisas as quais o tempo e as circunstâncias podem consumir, que essa riqueza pode ser encontrada e partilhada. Em relações amorosas, evidente é que a aparência importa e faz com que as pessoas aproximem-se. Simpatia, inteligência, idem. Contudo, somente algo na essência do outro, será capaz de capturar você, de forma irremediável. Que o homem moderno possa compreender que a chave não está fora, mas sim dentro do outro. Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III N.º 41 - ISSN 2764-3867

  • A Rocha

    A palavra ROCHA integra o meu sobrenome. Durante o ultimo mês, refleti sobre isso, após uma noite em que essa ideia fixa, de escrever sobre A Rocha, não me saia da cabeça. A princípio, entendi que era porque eu deveria render um tributo à minha família paterna, de quem herdei-o. Mas então, um acontecimento me fez perceber a razão verdadeira… Tenho me aproximado muito de Deus. Seja indo à missa, rezando pela manhã e à noite, ou tentando compreender que é preciso confiar na Sua vontade, todos os dias vou percebendo “pequenos milagres”, os quais me passavam desapercebidos antes. E a revelação sobre o pensamento obsessivo a respeito desse tema, me veio por um salmo da bíblia, que me foi enviado pela minha nora – o Salmo 28 – “a ti clamarei, ó Senhor, Rocha minha…” assim se inicia. Assim mesmo, com a palavra Rocha em maiúsculas, tal como eu havia pensado nela, durante a madrugada. A mensagem mais forte que se depreende deste salmo é a de que Deus é nossa força e nosso escudo. Logo, devemos confiar e entregar nossas angústias e aflições em suas mãos. Igualmente nossas alegrias e vitórias. Portanto, quando eu pensei n’A Rocha, não era sobre o meu nome de família que meu inconsciente falava, mas sim sobre Deus. Assim como esta, muitas outras provas tenho recebido. Deus se manifesta para nós por palavras, pessoas e acontecimentos. Se estivermos atentos, perceberemos, em meio a nossa atribulada rotina, o que Ele quer nos mostrar. Eu nunca fui muito católica, não praticava a religião, não ia à missa, rezava de qualquer jeito por dois minutos, na hora de dormir. Porém, a adoção de alguns hábitos diários tem feito de mim uma pessoa mais paciente, menos ansiosa, mais sábia. A oração, por si só, pode fazer maravilhas por nós, aprimorando nossas virtudes e transformando-nos em criaturas melhores. Essa é a primeira vez que vivo a Quaresma, fazendo exames de consciência diários, dedicando um tempo de meus dias à oração, indo à missa e buscando fazer compromissos pessoais de aprimoramento, em comportamentos que me incomodavam e que eu precisava modificar. Tenho dormido melhor, me sentido mais conectada e mais presente em tudo que faço, buscando evoluir e entender o que Deus espera de mim. É fácil: evidente que não. Os desafios são inúmeros. Mas esse é o depoimento de alguém que nunca se preocupou com nada disso, mas percebe maravilhas em sua vida, pela adoção de uma nova atitude. Desejo a todos uma reflexão sobre a Páscoa, a presença de Deus em suas vidas e o que Ele quer de cada um de nós. Na medida em que vamos cortando na própria carne, removendo o véu e percebendo o que é possível fazer diferente, um mundo novo se descortina para nós. A Rocha, a fortaleza de minha vida, muito embora o meu sobrenome sinalize isso, não está em mim, mas vem do Alto, pois Deus me ama e me protege de todo mal. Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III N.° 40 - ISSN 2764-3867

  • Submissão

    Esse é o título em português, de um livro que está dando o que falar. Trata-se de uma distopia, criada por Michel Houellebecq – escritor e poeta francês dos mais importantes de sua geração – que descreve uma França agora dominada por árabes, cujo presidente é islâmico e começa a adotar medidas drásticas, como transformar todas as instituições acadêmicas do país em escolas e universidades de ensino muçulmano obrigatório. Tudo começa quando Ben Abbes, um candidato a Presidente da República, aparentemente inexpressivo e inofensivo, integrante da Fraternidade Muçulmana, torna-se o favorito nas eleições, indo para o segundo turno, com promessas de um governo moderado e uma igualdade maior entre os moradores da França. Inicia-se, a partir deste momento, uma verdadeira revolução no país, com uma onda de violência desmedida, incêndios a ônibus e locais públicos, estabelecimentos fechados, caos urbano e criminalidades acentuadas. Islâmicos insatisfeitos resolvem reivindicar seus direitos, acuando e ameaçando a população. E o pior acontece. E o horror se instala. E professores universitários são demitidos, funcionários públicos exonerados, cidadãos perseguidos…do dia para a noite, as regras do jogo mudam, com mudanças drásticas e em ritmo alucinado, pipocando aqui e ali. François, o protagonista do livro, um professor de filosofia entediado e um tanto quanto perdido, refugia-se um uma cidadezinha do interior, de onde assiste, perplexo, ao que está acontecendo ao seu redor. A narrativa do livro – cujo título remete à submissão do povo francês ao novo regime – nos remete a outras distopias, como 1984 e Admirável mundo Novo, nas quais o regime de governo muda, alterando de forma avassaladora as vidas das pessoas. Temos visto isso tudo acontecer no mundo, muitas vezes debaixo de nossos olhos e até sem nos darmos conta. As regras do jogo da política mudam o tempo todo e com a globalização, tudo tornou-se possível. A Venezuela e a Argentina, de países prósperos e modelos de administração na América Latina, face às recentes gestões políticas que tiveram e ao golpe político sofrido pela primeira, mergulharam em um poço sem fundo, com sua população empobrecida, buscando comida no lixo e comendo até cachorros, para sobreviver, implorando por refúgio nos países vizinhos, na falta de outras alternativas. O Irã, até 1979 uma ilha de prosperidade, face ao petróleo e outros recursos naturais, foi arremessado para o terror dos extremistas islâmicos – os aiatolás – tornando-se uma ditadura sanguinária e um país completamente fechado ao Ocidente. O presidente deposto, para não ser assassinado, precisou fugir. A Rússia invadiu a Ucrânia, reivindicando para si o país, gerando morte e destruição em larga escala, fuga de sua população e a discussão, na OTAN e na ONU, sobre o que deve ser feito, para que Vladimir Putin seja contido e não avance sobre o Ocidente. Coreia do Norte e China estão aliadas, querendo impedir a autonomia da Coreia do Sul, que passou por eleições recentemente, elegendo um democrata. O Hamas cometeu um ataque surpresa a Israel, em outubro, assassinando mais de mil e quatrocentos israelitas e sequestrando 240, dos quais quase cento e quarenta ainda se encontram em seu poder. São os extremistas islâmicos, como EI, Hamas, Hezbollah e outros, que pretendem dominar e subjugar o mundo Ocidental. Praticamente todos os regimes dos países acima citados, a fim de manterem-se no poder, roubam, matam, corrompem, assassinam reputações, prendem, perseguem, expulsam de seu território, aqueles que não concordam com as suas regras do jogo. O Brasil, pobre Brasil, também passa por uma crise sem precedentes em sua democracia, a qual vem sendo atacada e vilipendiada diariamente, pelos três Poderes. Para onde quer que se olhe, poderá ser visto um cenário preocupante, a possibilidade de acontecimentos trágicos, com impactos em toda a população e um risco real de utilização de armas químicas, face às guerras já deflagradas. A SUBMISSÃO de que trata o livro, nunca esteve tão próxima de todos nós. Distopia ou realidade? Não sei. O desenrolar dos acontecimentos dirá. Só espero que o mundo encontre o seu trilho outra vez, a fim de que não tenhamos uma Terceira Guerra Mundial a caminho. Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III N.º 39 - ISSN 2764-3867

  • Ficção versus realidade

    Por sugestão do meu filho Lucas, assisti à série SILO, da Appletv plus. Os filhos, normalmente, são mais antenados do que nós, e as dicas que os meus filhos me dão, sobre filmes e séries, costumam ser imperdíveis. Com essa, não foi diferente. SILO é uma narrativa pós moderna, baseada na trilogia literária de Hugh Howey. Aparentemente, passa-se em um futuro depois do Apocalipse, em que os últimos dez mil habitantes da terra precisam viver em um silo subterrâneo, pois o ambiente exterior é repleto de gases tóxicos letais. No interior do fosso, o passado precisa ser descartado, nenhuma relíquia que traga lembranças da vida anterior pode ser guardada, não há registros históricos e os “pais fundadores” da comunidade são os únicos “deuses” a serem venerados. Entretanto, ninguém sabe ao certo como o buraco abaixo da Terra foi fundado, quem foram os tais fundadores e de que forma a vida terrena se deteriorou. Em Silo, falar do passado é crime, punível com o banimento e a expulsão do território, para o mundo exterior. Ninguém conhece mais nada, exceto o que está no interior do fosso. Entretanto, nem tudo é o que parece… Uma engenheira chamada Juliette (Rebecca Ferguson), percebe as discrepâncias do sistema, após o assassinato de seu namorado. Começa a investigar e descobre que a alienação que é criada, no interior do silo, para que as pessoas não ousem sequer pensar em outra vida possível, serve para encobrir uma realidade bastante diversa… Juliette começa a duvidar da impossibilidade de vida na Terra, investigando o passado, para compreender o presente. Várias mortes começam a ocorrer, episódios inexplicáveis, a fim de que as revelações sejam encobertas e a narrativa seja preservada. O Judicial, instituição que trabalha para punir e coibir, manter a ordem e a harmonia na comunidade, mostra sua outra face, sendo capaz de quaisquer atos, para que tudo permaneça como está. Juliette, que agora é a xerife, percebe as contradições do sistema e investiga cada vez mais… Hugo Von Hoffmannsthal já dizia que não há nada que esteja na política, que já não tenha sido previsto pela literatura. Afinal, o escritor faz uma leitura da sociedade, colocando no papel as tendências que nos rondam. Embora Silo seja uma distopia, a série reúne muitos elementos que exigem de nós uma reflexão. Será que temos acesso à verdade, ou aceitamos o que nos é dito como verdade, sobretudo pelo que nos chega pela mídia? Até que ponto não estamos recriando, como sociedade, o mito da caverna, de Platão, no qual as sombras reproduzidas na caverna, induzem todos à imaginação sobre a realidade, que não corresponde ao que é verdadeiro? No mito contado por Platão, há mais de dois mil anos, Homens presos a grilhões, em uma caverna, vêem reflexos do sol, nas paredes e têm receio de arriscar-se do lado de fora, por medo de serem devorados por monstros. Acontece que um deles liberta-se e sai, e ao ver o sol e a beleza do exterior, retorna à caverna, parra contar a novidade aos companheiros de escuridão. No entanto, é desacreditado e morto pelos outros, que preferem crer nas sombras e se manter acorrentados pelo medo. O mesmo acontece em Silo. Ao terem sua verdade contestada por Juliette e pelo xerife que a antecede – e acaba banido – as autoridades do fosso revoltam-se e a estrutura começa a ruir, pois a ordem ilusória não se sustenta, exceto pela política do terror. A série nos leva a uma profunda reflexão sobre o mundo moderno, as nossas crenças, o que nos chega aos olhos e ouvidos e naquilo em que devemos confiar. A verdade liberta, mas para isso, esta precisa ser conhecida. “Afinal, você vai acreditar em mim, ou nos seus próprios olhos?” Groucho Marx Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III N.º 38 - ISSN 2764-3867

  • O projeto transumanista

    O projeto transumanista e a necessária redução populacional O conceito de Transumanismo não é unívoco, ainda objeto de disputa em relação aos seus limites e conteúdo, sendo utilizado em contextos tão díspares, que permitem afirmações até mesmo contraditórias, mas que partem de uma premissa: os seres humanos podem e devem utilizar a tecnologia disponível para melhorar a condição humana natural. Em geral, sem a pretensão de esgotar todas as possibilidades teóricas, é possível compreender o Transumanismo como uma corrente de pensamento que defende o dever moral do progresso para estágios posteriores da Humanidade, utilizando a tecnologia para ampliar os sentidos e melhorar o corpo biológico. Há um desconforto ao tratar do tema. As implicações morais, filosóficas e religiosas não são irrelevantes. Temos esse direito? Quais as consequências de tamanha intervenção na condição humana? Como ficarão os arranjos sociais e políticos com o advento do transumano? Não são questões de menor importância. Todavia, estas implicações não vão conseguir impedir o avanço da tecnologia rumo ao corpo humano. Observe que o primeiro campo de aplicação dessas novas tecnologias é a saúde humana. Como impedir uma pesquisa que tenha potencial para erradicar doenças como câncer e Alzheimer? Depois de implementadas, como impedir que essa tecnologia seja utilizada para melhorar o corpo de pessoas sadias, ampliando sua resistência a outras doenças ou melhorando sua memória? A partir desse ponto, o potencial de uso militar e ilícito é extraordinário demais para não ser utilizado. Esclareça-se que não há nada de novo debaixo do sol. O ser humano sempre tentou melhorar seu corpo biológico, com a alimentação e com os exercícios físicos e mentais. A correção de problemas físicos com uso de tecnologia também não é novidade. Uso de próteses, óculos e outros artefatos para corrigir problemas físicos não são inventos recentes. Também não é novidade a utilização de drogas em tratamentos para melhorar o desempenho da memória e da concentração. Enfim, a humanidade sempre utilizou técnicas, remédios e artefatos para o melhoramento do corpo humano, aperfeiçoamento de suas funções e correção de problemas. Não há novidade nisso. Em certa medida, já somos todos transumanos. A tecnologia é uma extensão no nosso corpo, do nosso viver, do modo como percebemos a realidade. Esse texto chega ao leitor através da tela de um aparelho, conectado à Internet. Uma criança nascida na alta Modernidade já amealhou mais conhecimento que um ancião da Idade Média. Os gadgets se tornaram extensões do corpo humano. Em breve, integrarão o corpo humano. Talvez um dia sejam o corpo humano. O diferencial significativo no Transumanismo são as ferramentas de melhoramento humano. As novas tecnologias permitem o desenvolvimento das potencialidades do corpo humano em um nível interventivo jamais imaginado pelos primeiros Moderno. Não se trata mais de curar doenças, mas prevenir sua existência antes do nascimento do paciente, mediante um mapeamento genético dos pais. Não se trata mais de uma prótese, mas de um outro órgão fabricado a partir do material genético do próprio paciente. As novas tecnologias de biohacking permitem assumir a governança da própria estrutura biológica do corpo humano, modificando-o para desenvolver os sentidos físicos, a capacidade mental, inclusive erradicando doenças e ampliando tanto a possibilidade de implantes, inclusive de órgãos humanos geneticamente produzidos, que se teoriza a possibilidade do ser humano chegar ao ponto de flertar com a imortalidade. Outro aspecto que diferencia o Transumanismo é a ideia da promoção de uma nova Humanidade, melhorada biotecnologicamente, alicerçada em uma nova Civilização. Uma evolução que não dependa do acaso das mutações genéticas, mas que seja operada conscientemente pelo próprio ser humano. Em última análise, não se trata apenas da intenção de matar Deus, mas sobretudo de tomar o seu lugar para corrigir os erros do projeto divino, fazendo um novo ser humano à própria imagem. Contudo, a transição para uma Civilização transumana não é uma empreitada fácil, sendo mais provável que nunca aconteça. Além das dificuldades tecnocientíficas, os revolucionários planificadores transumanistas ainda teriam um desafio de grandeza inimaginável: o paradoxo demográfico. O Transumanismo propõe a reengenharia do próprio corpo humano, tornando-o melhor, mais funcional e mais resistente, com a possibilidade de reparar ou repor órgãos indefinidamente, estendendo a vida ao ponto de flertar com a imortalidade. No entanto, já somos mais de sete bilhões de seres humanos e se todos se tornarem imortais ou quase imortais, como vamos continuar provendo todas as nossas necessidades, considerando a limitação dos recursos naturais? Outras gerações virão, aumentando a pressão demográfica sobre as fontes de recursos naturais não renováveis. O paradoxo demográfico pode ser enunciado do seguinte modo: o mundo transumano pretende ser o berço de um novo ser humano melhorado, mas se todos os seres humanos forem melhorados não haverá mundo suficiente para o transumano. A única conclusão lógica aceitável, em face desse paradoxo, é que a passagem do transumanismo utópico para o transumanismo científico demanda não apenas um controle de natalidade rigoroso, mas sobretudo um programa eficiente de redução populacional global. Entretanto, uma redução populacional em escala global é um problema grave não apenas de meios, mas sobretudo de logística, demandando um esforço coordenado em escala global jamais visto em nenhum momento histórico anterior. Seria preciso um grupo coeso, com recursos financeiros ilimitados, que detivesse o controle dos principais veículos da mídia mundial, bem como influência política nos países que integram o G7, além de ter poder de decisão nos órgãos internacionais multilaterais, sobretudo na ONU e na União Europeia. Esse grupo hipotético teria que ser capaz de promover um recomeço na História, uma espécie de great reset. Além da dificuldade em estabelecer uma espécie de Fórum Mundial decisório, por mais força econômica e política que tivesse, este grupo seleto não poderia utilizar pura e simplesmente da violência para reduzir a população global, em face da quantidade muito superior de indivíduos a serem eliminados e de sua provável resistência. É preciso utilizar o método cartesiano, dividindo o problema maior em partes menores, para resolvê-las gradativamente. Desse modo, um programa de redução populacional deve ser dividido em etapas, a partir de uma mudança dos padrões culturais que incentivam a procriação. O primeiro passo é destruir o modelo de família monogâmica, invertendo seus pilares lógicos. Sem isso, a natalidade não será reduzida. É preciso utilizar todos os meios de propaganda e marketing, o cinema, a música e as artes em geral, para moldar novos arranjos familiares, que desencorajem a reprodução humana. Relações entre pessoas do mesmo sexo, casais que substituem filhos pelo cuidado com animais, ficar solteiro, estigmatizar a mulher que não trabalha, o culto ao corpo e aos músculos, o individualismo, hedonismo, todos esses padrões de comportamento devem ser normalizados, incentivados até se tornarem regra. Gerar mais de um filho deve ser visto como uma aberração, algo inusitado, até mesmo absurdo. Aliás, a própria instituição do casamento deve ser vista como algo obsoleto, desnecessário. O divórcio deve ser banalizado, facilitado ao extremo. O resultado pretendido é o controle da natalidade. Qualquer narrativa, por mais absurda, é válida para promover o controle da natalidade, como dizer que é egoísmo procriar porque a água do planeta está acabando. Observe que a destruição da instituição familiar jamais será possível sem um ataque sistemáticos aos fundamentos da tradição judaico-cristã. O judaísmo e o cristianismo devem ser apresentados sempre como ideias retrógradas, ultrapassadas, preconceituosas, misóginas, até mesmo ridículas. O padrão da família judaico-cristã deve ser simplesmente eliminado, porque é tendente à procriação. Ainda assim, sempre haverá aqueles que insistirão em se relacionar com pessoas do sexo oposto e procriar. Por isso, os instrumentos econômicos devem ser utilizados para reforçar os novos padrões culturais necessários ao controle da natalidade, de modo a tornar a criação de filhos algo absurdamente dispendioso. Do parto à faculdade, os pais devem ser forçados a investir fortunas. Roupas, alimentos, educação, lazer, saúde, brinquedos, todos os itens devem se manter sempre em valores elevados e crescentes, aumentando a pressão sobre os que insistam em querer ter filhos. A ideia de sucesso e realização deve ser deslocada para os bens materiais que as pessoas possuem, de modo que investir na educação de filhos será compreendido como desperdício de recursos que poderiam ser melhor empregados na aquisição e ostentação de bens. O ideal de uma pessoa bem-sucedida deve corresponder a alguém rico, solteiro, musculoso, promíscuo, que ostente muitos bens e não tenha filhos. Quanto mais uma pessoa se afaste desse padrão, tanto mais será considerada uma pessoa fracassada. Por fim, não se pode falar em controle de natalidade sem tratar da legalização e incentivo ao aborto. Investir em esterilização e meios anticoncepcionais, até mesmo na inserção nos alimentos industrializados de substâncias com potencial para causar infertilidade, são medidas necessárias, mas não são suficientes. O aborto, combinado com uma campanha de “conscientização” sobre os direitos da mulher ao seu próprio corpo, é o único meio eficaz de reduzir definitivamente a natalidade, inclusive podendo até mesmo inverter as taxas de crescimento para decrescimento populacional. O aborto é o mais eficaz instrumento de extermínio em massa inventado pela humanidade. Jamais haverá um mundo transumano sem a ampla legalização do aborto e a facilitação ao seu acesso. A prática de assassinar fetos humanos nos ventres das mães deve ser normalizada ao ponto de ser tão comum quanto o ato de cortar o cabelo ou pintar as unhas. Mais uma vez, a propaganda midiática em sentido amplo será fundamental para distrair as massas da contradição entre o incentivo ao aborto e o aumento da proteção dos embriões de outras espécies, tais como ovos de tartaruga e aves raras, filhotes de baleia e de urso panda, por exemplo. Cumprida essa fase primeira, quando os índices de natalidade estiverem em patamares aceitáveis, será preciso administrar uma solução para o excedente de seres humanos que não poderão migrar para um mundo transumano. De logo, a ideia de simplesmente deixá-los para trás deve ser rejeitada, porque isso causaria convulsões, revoltas, com a necessidade de um uso desnecessário e dispendioso de recursos, sobretudo de tempo, com a possibilidade de que essa reação se estenda indefinidamente, uma vez que os deixados para trás seriam a ampla maioria da humanidade. Mas como eliminar pelo menos 6,5 bilhões de pessoas, de modo rápido o suficiente para evitar a organização de uma resistência? Paradoxalmente, a solução para este problema pode ser encontrada precisamente nos textos bíblicos, notadamente do Livro das Revelações de João, que narrou ter visto quatro cavaleiros no horizonte: a Morte, a Fome, a Guerra e a Peste. Seguindo esse cronograma, a Morte dos desnecessários demanda a Fome, a Guerra e a Peste. A Fome. O controle da produção alimentícia é fundamental em duas frentes: produzir alimentos com menos nutrientes, inclusive investindo em produtos industrializados, que permitam a inserção de substâncias que causem a infertilidade. Além disso, é preciso desencorajar a produção de alimentos naturais, combatendo sem tréguas o agronegócio, utilizando as narrativas ambientais sempre úteis para mobilizar as massas. A produção de carne em geral, leite e seus derivados e os produtos hortifrutigranjeiros devem ser apontadas como causas dos problemas ambientais mais visíveis, como o aquecimento global. A ideia é promover o aceite de alimentos industrializados produzidos artificialmente, com controle de escala e capacidade de servir como meio para administração de um programa de controle de natalidade, mediante uma esterilização indireta. Outrossim, quando os alimentos artificiais forem amplamente utilizados, quem controlar a produção desses alimentos sintéticos poderá determinar quem se alimenta ou não, apenas reduzindo o fornecimento. A Fome como arma não é necessariamente uma novidade (vide Holodomor), mas a escala global exige um controle de produção que só pode ser alcançado com a massificação do consumo de alimentos sintéticos. A Guerra foi sempre um importante instrumento de redução populacional. Ainda que o objetivo primordial das Guerras seja poder e dinheiro, a redução populacional é um efeito que se segue. Uma Guerra Mundial, com uso de artefatos nucleares, seria um meio rápido de eliminar os desnecessários rapidamente, enquanto a elite transumana aguardaria a passagem do inverno nuclear em abrigos bem protegidos. O problema dessa solução é a perda de controle quanto aos efeitos em relação aos ecossistemas terrestres. O ideal seria uma Guerra circunscrita à Eurásia, mas a contenção geográfica dos efeitos do uso de armas nucleares é um problema residual importante. A Peste. O uso de armas biológicas também está muito longe de ser algo inovador, mas o conhecimento científico atual, aliado aos meios de transporte, possibilitam a proliferação de patógenos fabricados biotecnologicamente em escala pandêmica. A dificuldade aqui é a contaminação controlada. Espalhar simplesmente um vírus no ar, por exemplo, poderia ampliar a contaminação de modo a atingir também os transumanos ou tornar o planeta inabitável ou insalubre ao extremo. Seria preciso contaminar diretamente os desnecessários, fazendo-os ingerir o patógeno ou serem inoculados. O problema é como fazê-lo? Como convencer 6,5 bilhões de pessoas, em países diferentes, com culturas diferentes, a aceitarem ser contaminadas? O uso da força mais uma vez é inviável, em face do número de indivíduos. Seria preciso uma motivação de tal magnitude, uma lavagem cerebral tão forte, que fosse capaz de fragilizar o instinto de sobrevivência e a capacidade de discernimento da população mundial. Como se vê, uma empreitada praticamente impossível de ser realizada. Por tudo isso, a passagem para um mundo transumano é uma possibilidade muito improvável. Possivelmente, o transumanismo se concretizará em algumas tecnologias caríssimas, restritas a poucos. A não ser que… REFERÊNCIAS A revolução transumanista TECNONATUREZA, TRANSUMANISMO E PÓS-HUMANIDADE: O DIREITO NA HIPERACELERAÇÃO BIOTECNOLÓGICA (2020) Transumanismo e a imagem de Deus: A tecnologia de hoje e o futuro do discipulado cristão Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. III Nº 38 - ISSN 2764-3867

  • “Rio 40 graus, cidade maravilha, purgatório da beleza e do caos”

    Com o refrão de um dos grandes sucessos de Fernanda Abreu, lançado em 1992, iniciamos nossa reflexão. O ritmo envolvente da música não é suficiente para esconder a verdade estampada em sua letra. Vamos falar da Mui Leal e Heroica Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, que ostenta este título oferecido por D. Pedro I. Não trataremos da parte de sua história que deu causa a tão honorífico título, mas de seu ocaso. Que cataclismos poderiam ter levado uma das mais visitadas cidades do Brasil, que entre 1763 e 1960 foi Distrito Federal, por consequência a vitrine e câmara de eco para costumes, cultura e política, a mergulharem uma espécie de caos purgatorial para seu povo? A cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada por Estácio de Sá em primeiro de março de 1565, como dissemos foi Distrito Federal até que em 21 de abril de 1960, com a inauguração de Brasília, iniciou uma triste jornada de decadência e imoralidade administrativa. Entretanto, a transferência da Capital para Brasília não seria e de fato não foi suficiente para provocar os danos que ora observamos. 1974 guardaria uma nova punhalada na alma da antiga terra de kari’oka. A fusão do Estado do Rio de Janeiro com o Estado da Guanabara deu origem a configuração do Estado conforme conhecemos hoje, relegando o importante Estado à condição de cidade. Ainda assim, aquele rebaixamento também não bastaria para afetar a moral e a importância do Rio de Janeiro. Se não foram as mudanças de status administrativo que soterraram a cidade e sua história, seus administradores cumpririam com eficiência a nefasta tarefa. Iniciaremos a lista de governadores com Antônio de Pádua Chagas Freitas, ou Chagas Freitas como era conhecido. Advogado e jornalista, foi governador da Guanabara, eleito indiretamente para a gestão 1971 a 1975 e eleito governador do Estado do Rio de Janeiro entre 1979 e 1983. Sua característica fundamental era o clientelismo. Sua aliança com o funcionalismo público, assim como o aparelhamento promovido pela distribuição de cargos, além do uso de seu jornal (O Dia) para direcionamento da opinião pública (segundo seus analistas), formataram o modelo de gestão que seria aplicado e ampliado nos governos posteriores. Em 1979, retornando de seu período de exílio, Leonel de Moura Brizola, figura conhecida na política nacional no período anterior ao regime militar, em função de sua ativa participação de apoio a João Goulart (seu cunhado), retoma sua atividade política. Brizola lançou-se candidato ao governo do Estado do Rio em 1982, tendo como vice o antropólogo e sociólogo Darcy Ribeiro. Brizola, de histórico populista, estatista e claramente de viés esquerdista, getulista de primeira hora e presidente fundador do Partido Democrático Trabalhista (desde 1986 associado à Internacional Socialista); aliado a Darcy Ribeiro, que trabalhara junto a Anísio Teixeira (do qual falamos brevemente em nosso primeiro artigo), e que fora Ministro da Educação de João Goulart inauguraria o que o próprio Brizola chamou de “socialismo moreno”. O Rio de Janeiro esteve entregue à ideologia marxista, com sotaque demagógico-populista-tropical entre 1983 e 1986. Sob Brizola o Estado do Rio de Janeiro assistiu ao crescimento e fortalecimento do Comando Vermelho, ante a política de governo do não enfrentamento. Da mesma forma, a favelização e a desordem urbana foram fortemente aceleradas com a nova mentalidade brizolista que defendia nas palavras de Darcy Ribeiro: “favela não é problema, é solução”. Talvez sua marca mais visível até os dias de hoje sejam os CIEPs. Escolas idealizadas por Darcy Ribeiro que, oferecendo educação em período integral, alimentação e cuidados médicos básicos ao alunado fluminense, era financeiramente insustentável para um estado que já sofria com a “elefantíase administrativa”, o inchaço da máquina que não tendo combustível financeiro, sucumbiria em pouco tempo. Sucedendo a Brizola, assume o Palácio Guanabara o senhor Wellington Moreira Franco para o período entre 1987 a 1991. Para falar de Moreira é necessário antes falar de seu sogro, Ernani do Amaral Peixoto, ex-interventor indicado por Getúlio Vargas para o Estado do Rio entre 1937 e 1945 e governador entre 1951 e 1955. Amaral Peixoto mantinha o estilo populista ao modo de seu sogro, Getúlio Vargas. Aparentemente ter sogros influentes era e continuaria a ser passaporte para boas posições políticas. Moreira, que na juventude fora liga à Ação Popular que era um grupo radical de base marxista, era fruto do galho de Amaral Peixoto, recebendo indiretamente a seiva do troco getulista, sua demagogia já ficava demonstrada em uma de suas promessas de campanha onde afirmara “A promessa de acabar com a violência absoluta (no Rio) em seis meses não é absurda, porque o índice de violência é fruto da cumplicidade do governo com a criminalidade”. De fato havia algo de verdadeiro em sua premissa, a política do não enfrentamento soava como cumplicidade. Moreira não só não cumpriu sua promessa, como também viu acelerado o drama iniciado por Brizola. O Rio de Janeiro, já sufocado pelas políticas de governo com forte tendência ao apadrinhamento das classes mais necessitadas, o que de modo algum sugere a solução de seus problemas, mas antes a manutenção de sua condição subalterna e de apoio útil; perdia também grandes empresas que já na década de 90 fugiam do sufoco fiscal e da criminalidade em franca ascensão. O sucessor de Moreira Franco foi o ex-prefeito do Rio, ex-filiado ao PDT de Brizola, advogado defensor de presos políticos, e candidato pelo PSDB Marcello Nunes Alencar. Apesar de seu passado, Alencar promoveu privatizações como nos casos da CERJ, BANERJ, CONERJ e Flumitrens, tendo também extinto a Companhia de Transportes Coletivos do RJ (CTC-RJ).A linha de privatizações de seu governo (1995 a 1998), apesar de importantes, não desviou o Estado da rota seguida desde 1983. Os cupins da corrupção, os corporativistas, os narco-terroristas seguiam destruindo a beleza e riqueza da Mui Leal Cidade, deixando um rastro de caos. Em 1999 Alencar é sucedido por Anthony Willian Matheus de Oliveira, o Garotinho (1999 a 2002). Este abraçou no início de sua carreira política a Juventude Socialista através de seu partido, o PDT. A filha do político de Brizola, como fruto do brizolismo, não cairia longe de sua árvore. Populista e demagogo como seu inspirador, seguiu a receita da manutenção da pobreza, utilizada como sustentáculo político. A criação dos conhecidos restaurantes populares e também do cheque cidadão exemplificam bem a questão. Aliás, sobre o Cheque Cidadão, em sua época pairaram denúncias e suspeitas de favorecimento e sua utilização por parte de lideranças religiosas, que supostamente distribuíam os cheques em seus redutos religiosos em troca de apoio político. Em 2002 Garotinho se afasta do cargo para concorrer à eleição presidencial. Deixa em seu lugar Benedita da Silva (PT), dando tons ainda mais vermelhos ao Estado. Benedita, sem grandes dotes, apenas ocupou a cadeira de governadora porém, o governo pareceu acéfalo em seus poucos meses de pseudo-gestão. As questões sociais, econômicas, a criminalidade e a desordem seguiam sem combate. Mais interessados com os aspectos exteriores da gestão pública, os governos se sucediam repetindo as velhas fórmulas da esquerda brasileira: corrupção, populismo, clientelismo, demagogia e destruição. Até aquele momento o cerne da questão não era tratado. Rosa Barros Assed Matheus de Oliveira, a Rosinha Garotinho foi eleita para o período entre 2003 e 2006 substituindo Benedita da Silva. Na verdade pouco há que se acrescentar sobre sua passagem pelo governo do Estado, sendo esposa de Garotinho, foi de um continuísmo óbvio e constrangedor. Deixou um vácuo de gestão, se limitando a manter o que já fora feito. Tanto Rosinha quanto Garotinho enfrentaram posteriormente impugnações de candidatura, denúncias diversas, processos e, prisão. Um de seus atos finais como governadora foi a convocação de todo o cadastro de reserva de concurso público para o magistério. Esta medida pode ser encarada como necessária para o bom funcionamento da estrutura educacional mas, provocou oneração brutal da folha de pagamento de seu sucessor, visto que foi executada de uma só vez. O Rio de Janeiro estava a apenas mais um passo do abismo de onde ainda hoje não conseguiu sair. Apoiado pela família Garotinho, o governado releito para o período entre 2007 e 2010 (reeleito até 2014) foi Sérgio Cabral Filho. De família ligada à esquerda intelectual, tendo sido seu pai, o jornalista e crítico musical Sérgio Cabral um dos fundadores do periódico O Pasquim. Iniciando sua carreira pelo PMDB, dirigiu a Companhia de Turismo do RJ na gestão Moreira Franco, foi deputado estadual por três mandatos, presidente da Alerj e finalmente governador do Rio. Não trataremos do seu início brilhante, mas apenas e de forma breve da marca que deixou após sua gestão. As grandes obras, deixaram rastros de superfaturamento, corrupção, malversação, formação de quadrilha entre outras acusações e condenações que sob Cabral, destruíram a economia fluminense. A Operação Lava Jato descortinou um panorama, que ainda que não fosse novo, era mais assustador e escandaloso do que poderia supor os mais pessimistas observadores da história. Cabral elevou a corrupção a níveis megalômanos. Seus governos levaram ao ocaso de um importante estado, que já fora influente e bem administrado. De suas obras ainda vemos os esqueletos, a incompletude e a degradação, testemunhos do quanto nos falta aprender com nossa história. A renúncia de Cabral em 2014 para concorrer ao governo federal, entregou o Estado a seu vice, o senhor Luiz Fernando Pezão. De seu governo também pouco falaremos, pois pouco há que se falar. Da mesma forma que Benedita da Silva e Rosinha Matheus, Pezão apenas ocupou a cadeira de governador, repetindo à exaustão as mesmas fórmulas e comportamentos. Sua eleição para o governo do Estado para o período entre 2015 e 2018 funcionou como um estado febril em um corpo em estado terminal. Sua inépcia e seu grotesco despreparo, mais que uma causa para a tragédia, eram sintomas de um quadro ainda mais grave: o Estado definhava moral e economicamente a olhos vistos. A base estruturada por Chagas Freitas, associada à sucessão de desgovernos de viés esquerdista, em seus mais diversos tons, desde Brizola a Pezão, mostram que não tínhamos nem mesmo em nível regional a organização de movimentos conservadores que pudessem fazer frente à esquerda. Sucessivos apadrinhamentos políticos, aparelhamento da máquina administrativa e a manutenção do regime oligárquico destruíram as possibilidades que este Estado possui. É importante explicar que a esquerda não se caracteriza pelo seu discurso nem pela sua ideologia, mas antes pela sua visão de mundo. Ainda que não se possa classificar os governadores citados como socialistas em termos ideológicos, seus comportamentos políticos encarnavam com precisão a forma de conquista e manutenção do poder de qualquer governo socialista. Ainda hoje, muitos negam com veemência qualquer alinhamento ideológico à esquerda, ignorantes de serem instrumentos e usufrutuários daquela ideologia nefasta. O Rio de Janeiro é hoje um purgatório onde seus cidadãos pagam pelos crimes de não interessarem-se por política, entregarem-se de bom grado às políticas assistencialistas e omitirem-se diante da desordem social e urbana como se nada tivessem com o problema. O caos é nossa herança e legado. Que tenhamos a sabedoria para buscar reformar nossa própria visão de mundo e também o nosso Estado, mediante melhores escolhas no futuro. Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. I N.º 03

  • Conhecimento é poder

    Há, nas pessoas em geral, uma dificuldade muito grande de entendimento do mundo, das coisas que acontecem ao seu redor, e até mesmo do que lhes é dito, ou do que está escrito. A representação da realidade, para a grande maioria dos indivíduos, é completamente diferente do que existe. Aqueles que não conseguem entender as coisas como elas realmente são, podem ter essa dificuldade por ausência de conhecimento (como por exemplo as crianças pequenas e os analfabetos), por deficiência mental ou, por fim, por analfabetismo funcional. Vamos tratar, aqui, desse terceiro grupo de indivíduos. Quem, apesar de estar no gozo pleno de suas faculdades mentais, aceita tudo que lê, vê e escuta sem raciocinar, absorve estórias, ideias, notícias, narrativas, conhecimentos e comentários, sem avaliar sua veracidade, seu enquadramento na realidade e seu verdadeiro objetivo, vendo uma coisa e compreendendo outra, pode ser considerado analfabeto funcional. Monteiro Lobato eternizou sua célebre frase: “um país se faz com homens e livros”. Porque somente através da leitura, podemos ampliar o nosso espectro de visão e entender a realidade como ela é, e não como nos é contada. Só a leitura pode nos resgatar do analfabetismo funcional. Ler os clássicos, os escritores tradicionais, a literatura que atravessou os séculos, nos dará amplo entendimento da realidade e nos permitirá identificar as falácias que nos são enfiadas goela abaixo. Embotar a inteligência e impedir o pensamento lógico é uma poderosa arma de dominação, como ensinou Antonio Gramsci, comunista italiano, que escreveu seus Cadernos do Cárcere, ensinando como se implode uma sociedade, dominando-a de dentro para fora: minando suas estruturas de conhecimento, família e religião. Se entendermos que estupidificar as pessoas é um caminho natural para controlá-las, perceberemos a importância do estudo para a formação do intelecto, e compreenderemos porque a literatura de verdade sumiu das prateleiras das livrarias e do ensino escolar/universitário. É por causa disso que vemos cada vez menos pessoas capazes de desenvolverem raciocínio, pensamento ordenado, intelectualidade: porque de cinquenta anos para cá, o Brasil encontra-se nesse processo de desconstrução de dentro para fora. Toda a esquerda que retornou do exílio, alojou-se nas Universidades (como professores), na política, na mídia e nas artes. E obedientemente, iniciou o processo ensinado por Gramsci. Aristóteles dizia que conhece-se uma sociedade pela música que ali se produz. Estamos em maus lençóis… os gêneros musicais e os cantores consagrados e disseminados mundo afora, atualmente, não merecem sequer ser comentados…a juventude não sabe o que é música clássica, nunca ouviu falar de Bach, não imagina o que seja uma ópera. E recebe, pelos ouvidos, esse lixo cultural que é tocado por aí. Esse processo de idiotização da sociedade, dominação do pensamento e aniquilação da autoridade intelectual é visto em todo o mundo, e foi muito bem explicado por Flavio Gordon em seu livro, A Corrupção da Inteligência. Ali ele descreve, passo a passo, a tentativa de destruição do conservadorismo, dos pilares da sociedade, e a implantação de uma nova era de pensamento. Se observarmos os atuais discursos sobre neutralidade de gênero na linguagem, isso fica facilmente evidenciado. Na Alemanha de Hitler, a linguagem foi sendo modificada, dando-se sentido diverso a determinadas expressões e palavras, a fim de que a população fosse convencida acerca do acerto das estratégias aplicadas pelo nazismo, e de sua necessidade, para proteção do bem comum. Modificar a linguagem e seu alcance é um passo importantíssimo na dominação da sociedade. Afinal, o que há de mais poderoso, do que transformar o pensamento? Ao analisarmos a lavagem cerebral que o comunismo e o nazismo implantaram nos locais onde foram integralmente aplicados esses regimes de governo, fica nítida a corrupção da inteligência da população, por meio de narrativas mentirosas, as quais foram absorvidas pela comunidade. Por essa razão, e pela possibilidade de aprendermos com erros do passado, presentes na história, nossa melhor defesa é o ataque. Precisamos investir tudo na educação de qualidade, na Inteligência ordenada para o saber integral e na busca da verdade. Somente assim, poderemos afastar o mal, perseguir o bem e enxergar as coisas como elas são. Conhecimento é poder. Vence a guerra quem domina as estratégias e sabe a hora certa de atacar, já dizia Sun Tzu em A Arte da Guerra. Vivemos uma guerra contra a Inteligência, que atinge o mundo inteiro. Gerações inteiras estão sendo privadas do aprendizado dos valores morais e espirituais que importam e ordenam a sociedade. Não à toa, o vazio e a depressão se instalaram entre nós. Vamos começar? Já passou da hora, mas ainda há tempo!!!! Podemos aproveitar nossas promessas de fim de ano, incluindo essa: quero me tornar mais inteligente!

  • Em busca do coturno sujo

    Certa vez, lembro-me de ouvir a seguinte expressão, “infelizmente, estão procurando um coturno sujo”, confesso que não entendi em um primeiro momento do que se tratava, mesmo por nunca ter usado um coturno. Mas após alguns questionamentos, descobri que tal vernáculo é usado quando alguém quer achar um defeito mesmo que não o encontre, algo como se um superior militar procurasse nos subordinados uma falha para poder puni-los, não achando nada de relevante, busca então uma falta insignificante, podendo assim saciar sua pretensão punitiva. Recordo-me da fábula do lobo e o cordeiro, na qual o lobo alegava que o cordeiro, que bebia água de um córrego sujava o veio, prejudicando o predador de aplacar sua sede, entretanto, o herbívoro retrucou afirmando que o fluxo d’água corria na direção oposta e que o lobo tinha acesso à água antes do cordeiro, o que de nada adiantou, pois, tudo era uma desculpa para que o lobo justificasse abater o seu interlocutor, tendo em vista que o único objetivo era devorar a presa. Não são raros os exemplos em que o julgador criar argumentos transversos para aplicar uma sanção aos seus desafetos, julgando não pelos fatos, mas pela pessoa que está em julgamento. Algo indubitavelmente perigoso. O que pretendo trazer à reflexão, não são os intitulados “ crimes imaginários ”, cuja criação, no mesmo propósito, serve aos anseios daqueles que julgam, mas na busca por uma falta que possa justificar a punição. Creio que a criação de infrações para perseguir opositores está em um momento subsequente à busca do coturno sujo, uma vez que, achada uma justificativa para punição, não será necessário inventá-la. Um bom exemplo de prática nociva que pretende buscar uma ação ilícita de um desafeto é a conhecida fishing expedition , tão combatida e utilizada pelas mais altas cortes, sendo a busca por elementos que possam indicar uma infração partindo de premissas vagas ou vazias, claramente, porque o alvo da “pescaria” é um desafeto daquele que conduz a investigação. Não obstante, investigações de cunho amplo, sem parâmetros preestabelecidos, que se revistam de obscuridade e perdurem por um período indeterminado permitem ao condutor das investigações perseguir qualquer um que possa, ainda que sem lastro, ser enquadrado em qualquer infração, bem como, aos devassar a intimidade, poderá a autoridade investigadora obter informações que não se revestem de ilegalidade mas denotam questões de foro íntimo. Cogitando como seria prazeroso a um inimigo conhecer da intimidade de alguém por meio da invasão de sua privacidade, pode-se perceber o perigo de ações movidas pela vontade injustificada de determinada autoridade. No que diz respeito ao coturno sujo, é inegável que uma autoridade, seja ela qual for, deve se submeter a limites intransponíveis, evitando assim que o autoritarismo seja exacerbado e pessoas ou instituições desafiem todo um ordenamento jurídico em busca de poder. Não sendo possível encontrar o coturno sujo, é provável que a autoridade, ávido por devorar sua vítima, apele para os crimes imaginários, sendo um recurso ainda mais torpe. Em tempos difíceis em que passamos, é impossível não se assustar com argumentos de que a censura não deve ser permitida, mas que uma pequena exceção à regra em nome de um processo eleitoral justo pode ser tolerada, bem como, a imprensa tenha que medir o que é dito no corpo de uma entrevista, para que não seja responsável por acusações que o entrevistado venha a fazer. E pensar que o jornalismo, há pouco, defendia a responsabilização das plataformas pelo conteúdo que, embora não produzissem, veiculassem. Agora, parece que o ensandecido comandante, sendo superior, ou talvez supremo, decidiu que nenhum coturno está a salvo de sua revista à tropa . Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 36 Leia também: UMA CARTILHA FEITA NAS COXAS

  • O Pôr do Sol

    O pôr do sol mais lindo do mundo Além das cores, tinha o cheiro da maresia O curso da vida, do caminho cada segundo À frente um espelho, a maré em calmaria Chão de pedra, para descanso uma mureta nas quilhas ferrugem, um ninho de xexéu Luz morna, galante, fez uma pirueta Abriu nas nuvens um desfile do céu Soprou a brisa: é porto só de chegada! O tempo cochilou na mansidão do mar Acordou no alvoroço da passarada Apressado, cobriu o sol, brilho só de luar Texto veiculado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 32

  • Pobre América Latina

    Quem de nós não conhece a famosa música cantada por Belchior, que se inicia assim: “Eu sou apenas um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior…”? Acostumamo-nos a um complexo de inferioridade, típico das Américas do sul e central, que sempre justifica o fracasso, culpando os colonizadores. Entretanto, o maravilhoso Guia Politicamente Incorreto da América Latina, escrito por Leandro Narloch e Duda Teixeira, nos ensina que essa foi a história que te contaram na escola, a qual não corresponde, contudo, à realidade… Para os que não sabem, mas desejam entender o que se passa pelas bandas de cá, o ponto mais importante é desconstruir a ideia do bom selvagem e do conquistador malvadão. Livros narram a chegada dos espanhóis a várias terras posteriormente colonizadas, desmistificando que a superioridade de armas e de homens tenha sido a razão da “invasão de suas terras”. Em seu manual, Narloch e Duda explicam que os espanhóis, quando da chegada a terras de posse dos incas e astecas, foram auxiliados por indígenas – havia uma grande disputa territorial pelos silvícolas, que dividiam-se em tribos, as quais praticavam escravidão, assassinato, enterravam rivais ou dissidentes vivos e outros rituais. Algumas dessas tribos viram, nos colonizadores recém-chegados, uma oportunidade de derrotar seus oponentes, aliando-se aos espanhóis. Não houve uma rendição e uma submissão automática. Os espanhóis passavam fome, não conheciam os produtos agrícolas das regiões colonizadas, eram constantemente atacados, morriam assassinados ou de inanição, e os que sobreviviam, aliavam-se a tribos, para entenderem sobre o solo, os alimentos e o modo de cultivo, dando em troca proteção, produtos trazidos do país de origem ou trabalho. Nada vem de graça, nessa vida. O negócio tornava-se vantajoso para ambas as partes – para as tribos que sagravam-se vencedoras, eliminando ou expulsando as demais, e para os colonizadores, que encontravam em terras além-mar, produtos de que necessitavam e matéria-prima, para envio às suas nações, além de mão de obra farta e barata. Portanto, é tão despropositada a discussão sobre racismo reflexo, marco temporal, escravidão e outros temas tão em voga, em nossos dias: porque não há como mudar o passado e porque muitas coisas não aconteceram, exatamente, do modo que disseram. A segunda grande questão envolvendo a América Latina é a tendência ao combate ao capitalismo e à livre concorrência, como se a geração e a circulação de riquezas privilegiassem, tão somente, às grandes elites, outrora colonizadores. Esse é um outro ponto que constrói um discurso hipócrita e tendencioso, porque muitos dos que defendem uma distribuição equânime de renda e de produtos, desfrutam de uma condição diferenciada e privilegiada, e não abrem mão de seus bens de consumo. Ora, uma nação livre não se sustenta sem livre comércio, gerador de lucro. Sem lucro, perde-se o interesse de produzir, e sem produção, não há o que comprar, vender ou trocar. Por isso, tantas nações que vivem sob o regime comunista passam por escassez de produtos, precisando sobreviver com pouquíssima variedade de bens. A expectativa de lucro é o que movimenta a economia. A reserva de mercado também esfacela a possibilidade de livre concorrência, enriquecendo apenas aqueles que detém o monopólio da produção ou da revenda , na região. O terceiro ponto de convergência, nos países latinos, é o populismo. Grandes líderes despontam, nas Américas do Sul e Central, há décadas, por meio de um discurso em que o Estado deve proporcionar muitas coisas aos cidadãos, ainda que se oculte o outro lado dessa moeda: um Estado inchado, corrupto, com arrecadação elevadíssima, por meio do pagamento de impostos altos, pelos cidadãos. Para que o Estado te dê algo, que você não trabalhou para obter, esse dinheiro precisará vir de algum lugar. Muito provavelmente, será do seu bolso, do bolso do seu vizinho e do seu familiar. Não há mágica para lidar com isso. Para sair, o dinheiro precisa entrar. Portanto, líderes que propõem mundos e fundos com dinheiro público, farão com que o Estado quebre, ou, alternativamente, aumentarão a taxação de todos os cidadãos, se eleitos. Esses três fatores que descrevi, formam uma trinca que destrói a competitividade das nações, e a sua capacidade de inserirem-se como economias de ponta, no cenário mundial. A América Latina precisa abandonar essa fantasia, recheada de narrativas e de conceitos não confirmados pela História, com um discurso de exclusão, de vitimismo, de bom-mocismo do colonizado e mau-caratismo do colonizador. Todas as nações latino-americanas, sem exceção, curvaram-se a modelos populistas que apenas trazem pobreza, endividamento, corrupção e regimes ditatoriais de governo. Para que a democracia se aperfeiçoe, esta precisa estar de mãos dadas com o livre comércio e o lucro. Somente desse modo, países de terceiro mundo terão salvação, tornando-se grandes economias mundiais, livres do comunismo e da tirania. É preciso sair do complexo de primo pobre, deixar de culpar os outros pelos próprios infortúnios, tomar para si as responsabilidades que lhe cabem e ir à luta, trabalhar, gerar riqueza, fazer o dinheiro circular. Cidadãos livres e donos de seu próprio dinheiro: isso é o que torna uma nação forte. É essa a mensagem que a América Latina precisa aprender. “O problema com o comunismo é que um dia o dinheiro dos outros acaba”. “Deixe-me dizer em que acredito: no direito do homem de trabalhar como quiser, de gastar o que ganha, de ser dono de suas propriedades e de ter o Estado para lhe servir e não como seu dono. Essa é a essência de um país livre, e dessas liberdades dependem todas as outras”. Margaret Thatcher Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 32

  • Valor e virtude

    O fato de as pessoas sentirem-se especiais, únicas e exclusivas, hoje em dia, mesmo que não possuam qualquer habilidade ou talento diferenciado, vocação para coisa alguma ou valores morais elevados, é algo que me choca constantemente. O simples fato de existir, dá a todo e qualquer ser humano da face da Terra – que seja guiado pelo coach da moda ou por influencers de plantão – a possibilidade de “ser o que quiser”. Certo? Totalmente ERRADO. E a prova disso é a mediocridade que impera, a falta de perspectivas e propósitos de vida, o viver cada dia como se fosse o último, sem que se dê qualquer sentido a essa existência. A consequência desse sonho hedonista e desprovido de senso de realidade é a depressão. O vazio de uma vida sem porquê vai cobrar a conta, em algum momento, e o indivíduo perceberá que é uma fraude. Não possui nenhuma característica especial, qualquer superpoder, talento ou vocação, e segue pela vida sem saber bem para onde quer ir. Todos nós possuímos uma missão, um objetivo na vida, que é a evolução moral e pessoal. Esse era um entendimento intrínseco a todas as gerações, ao longo dos séculos, que infelizmente foi se perdendo, desde a segunda metade do século XX. Valores e virtudes são características constitutivas de nossa personalidade, dessa sendo indissociáveis, mas o homem moderno simplesmente não dá mais bola para isso. Um valor moral e uma virtude não se perdem na dificuldade. Não são negociáveis. Não perecem com o tempo. Caso você deseje fazer um teste, para compreender o que é um valor, basta que se pergunte se a característica que está sob análise é impactada pela passagem do tempo, podendo desaparecer ou mesmo alterar-se, devido às circunstâncias. Portanto, um corpo torneado, fama, fortuna, poder, não te tornam automaticamente uma pessoa virtuosa – muito embora a nossa sociedade acredite que sim. Porque estes são atributos perecíveis, pela passagem do tempo, por circunstâncias da vida, por mudança da situação fática, o que os torna absolutamente vulneráveis e frágeis, ante a realidade da vida. Para adquiri-los, você não precisa exercitar as virtudes, o que torna tais atributos acessíveis a qualquer pessoa, ainda que sem caráter ou inescrupulosa. A aquisição de um valor ou de uma virtude, ou o seu aprimoramento, estão intrinsecamente ligados a um movimento pessoal, a um esforço genuíno, a um exercício diário de cada um de nós. Ser virtuoso dá muito trabalho! E é pela narrativa que vem sendo construída na sociedade, de que você pode ostentar atributos e conquistar seu espaço, sem fazer muito esforço, que o corpo, a fama e a fortuna conquistaram um lugar de honra, na modernidade. Porque para conquistá-los, não é necessária uma reforma íntima. É muito mais fácil ser rico do que ser corajoso. Ser famoso do que ser honesto. Ser poderoso do que ser amoroso. Virtudes, para serem conquistadas e aprimoradas, exigem de nós muita abnegação, imenso esforço pessoal, disciplina e propósitos elevados. E a Civilização vive uma crise moral sem precedentes, o que torna tudo isso muito mais árduo de ser obtido. Enquanto o futuro da Humanidade era incerto, recheado de desafios, guerras, fome, miséria e morte, as pessoas precisavam desenvolver valores, virtudes, habilidades e motivações, para permanecerem vivas e buscarem um sentido para tanto sofrimento. Tempos prósperos e fáceis geraram pessoas acomodadas, fracas, sem determinação e, sobretudo, desprovidas de valores pessoais sólidos. Hoje, compra-se felicidade ali na esquina, vendida no invólucro dos prazeres e da diversão. Tudo está ao alcance de um clique na internet. Por que esforçar-se? Porque a vida, desprovida de algo maior que nos norteie, perde sua razão de ser. Por isso, vemos tantas pessoas anestesiadas, deprimidas, com olhar vazio e com medo de tudo. Gente como eu e você, que não sabe o que veio fazer no mundo, e que conta os dias sem grandes expectativas. Pra você descobrir o que veio fazer aqui e o que espera do seu futuro, você vai precisar encontrar a sua essência primeiro. Quem você é? Quais são os seus valores inegociáveis? Quem, dos que estão ao seu lado, é verdadeiro? Seus relacionamentos baseiam-se no sentimento que você nutre pelos outros, ou na utilidade que as pessoas têm para você? Se você morresse amanhã, qual seria o seu legado, o que diriam de você , em seu obituário? Nenhuma destas questões é de fácil resposta, mas todas elas encerram os pilares principais de nossas vidas: saber o que estamos fazendo aqui, quais são os nossos objetivos e propósitos, e, sobretudo, quem queremos por perto, nessa jornada. As companhias são primordiais, na formação de nosso comportamento e no aprimoramento das nossas virtudes. Buscar virtude, em um mundo tão contaminado por pessoas frívolas, relativização do certo e do errado, coisas impermanentes e comportamentos duvidosos é muito complicado. Entretanto, o outro lado dessa moeda é uma vida vazia e a imbecilização completa e constante. Enquanto o comportamento coletivo nos sinaliza algo totalmente desprovido de bom senso, precisamos ir além, mergulhar fundo em nós mesmos, daí emergindo com as respostas adequadas, para os nossos questionamentos. Tudo vem de dentro. Vale a pena tentar e encontrar o que está por baixo dessa superfície social, que todos nós ostentamos. A verdade é uma só. Ela existe e espera por você. Boa jornada! Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 31

  • Amando as coisas certas

    “O sentimento segue aquilo que amamos. Se amamos o que é verdadeiro, bom e belo, ele nos conduzirá para lá. O problema, portanto, não é sentir, mas amar as coisas certas. Do mesmo modo, o pensamento não é guia de si próprio, mas se deixa levar pelos amores que temos. Sentir ou conhecer, nenhum dos dois é um guia confiável. Antes de poder seguir qualquer um dos dois, é preciso aprender a escolher os objetos de amor – e o critério dessa escolha é: Quais são as coisas que, se dependessem de mim, deveriam durar para sempre? Há coisas que são boas por alguns instantes, outras por algum tempo. Só algumas são para sempre”. Olavo de Carvalho Eu conversava, ainda hoje, no carro, sobre esse assunto. O professor Olavo tentava dizer, nessa passagem, extraída de uma de suas aulas, o quanto, nos dias de hoje, perdeu-se a capacidade de prezar, buscar, preservar e perpetuar as coisas que são realmente BOAS, BELAS E VERDADEIRAS. Na efemeridade do presente, o prazer precisa ser imediato, o desejo deve ser prontamente satisfeito, nenhuma gratificação pode ser adiada ou negada. O homem moderno quer tudo para ontem, age como se o mundo fosse terminar amanhã, e assim agindo, vai-se dessensibilizando, perdendo a capacidade de análise e de avaliação. Afinal, como saber o que realmente vale a pena perseguir, aguardar, manter e eternizar, se não nos detemos em mais nada? Como perceber o que realmente importa, nessa vida, se o gozo e o prazer precisam acontecer todos os dias, e a tatuagem da moda é “carpe diem ” (aproveite o dia)? Na velocidade do pensamento e do agir, o que é importante se perde. Por essa razão, amores sinceros são tão raros, amizades verdadeiras quase não existem, relações despidas de utilidade e baseadas no sentimento puro e cristalino estão fora de moda. O critério moderno é a utilidade : no que essa coisa, essa situação ou essa pessoa podem me ser úteis? Eu vivi uma grande crise de identidade no final de 2019. Nem vou colocar a culpa na pandemia, porque esta aconteceu antes… Eu vivi uma tragédia pessoal e familiar, que me fez repensar profundamente meus valores e perceber que estava desperdiçando a minha vida, com coisas, pessoais e atitudes que não mereciam durar para sempre. A partir desse ponto de ruptura, eu passei a repensar profundamente toda a minha trajetória, e a buscar resgatar o bom, o belo e o verdadeiro, que haviam se perdido pelo meu caminho. Não vou poder dizer que foi fácil... houve muitas consequências... Afinal, perceber-se inserido em uma vida destituída de um sentido, um propósito maior, e sentir-se envergonhado das próprias escolhas, exige uma mudança drástica! Começar a pensar, como o texto do início diz, nas coisas que merecem durar para sempre, e nestas manter o foco, faz com que você precise despir-se, primeiro, da vaidade, calce as sandálias da humildade, e se analise sem pena ou sem medo. A seguir, você começará a precisar de mais tempo consigo mesmo, menos barulho, mais silêncio, para olhar pra dentro, fazer uma autoanálise, sentir a dor das suas constatações, chorar sozinho, fazer promessas e tomar resoluções. E então começará a faxina… que é a pior parte, a mais pesada. Relações por interesse ou utilitárias precisam descartadas. O lixo emocional tem que ser eliminado. Tudo passará pelo crivo: é de verdade? É bom? Merece perdurar? Como é duro constatar que a maioria das nossas relações orbita em torno de interesse… E que nós mesmos alimentamos isso, muitas das vezes… Será preciso ser verdadeiro. Coerente. Falar uma coisa e fazer outra não vale. Ser fofoqueiro e invejoso também não. Para atrair e pessoas boas, amizades valorosas e desenvolver virtudes, você precisará, acima de tudo, exercitar, o tempo todo, um comportamento virtuoso. Deixar para trás todo o lixo que adotamos, como comportamento, pensamentos e desejos, em nossas vidas, é extremamente difícil. O hedonismo está tão em voga porque não dá trabalho. Desejar bens e prazeres imediatos é muito mais simples. O que é mais complexo, afinal? Ser bom, ganhar um lugar no céu, perdoar verdadeiramente alguém, conquistar um amor sincero e desinteressado, ou sair por ai fofocando, expor-se nas redes, ter relações fugazes, ostentar? Ser virtuoso é extremamente difícil e sobretudo complicado, no mundo em que vivemos. Aviso logo que há bastante sofrimento envolvido nessa busca. Muitas lágrimas serão derramadas. Muitas decepções acontecerão. Mas a outra opção, embora pareça a mais fácil, é muito pior, a longo prazo: Viver sem um propósito, não deixar um legado para aqueles que você preza, ser exemplo para seus filhos, não ter amigos verdadeiros. Não poder sonhar com o céu. Não ter AMOR. Porque o maior dos presentes que a faxina e a verdadeira mudança íntima podem trazer, para nossas vidas, é o AMOR. Ele é a chave, para que possamos abrir todas essas portas. Sem amor, não teremos como buscar a verdade, a bondade e a beleza. O amor está no centro de tudo. E, infelizmente, nos acostumamos a viver sem ele. Depois de uma longa trajetória, em muitos aspectos desperdiçada, consegui, da história da minha vida, extrair o que merecia perdurar, e abrir espaço, removendo tudo que não me servia mais, para que o novo chegasse, mudando o que precisava ser modificado. E descobri que o que dá sentido a todo o resto é o AMOR. Pelos filhos. Pelos amigos. Pela família. O amor romântico que une duas pessoas. O amor pela profissão. O amor que advém da caridade. O amor por Deus. A VIDA SÓ VALE A PENA SE VOCÊ DER E RECEBER AMOR. O AMOR é o que merece durar para sempre. Desejo a cada um de vocês uma vida repleta desse sentimento que tudo transforma. Artigo publicado na Revista Conhecimento & Cidadania Vol. II N.º 30

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