Origem da Praça Seca
Bairro de Jacarepaguá
A jaqueira centenária da Rua Baronesa em frente a Rua Içá é do tempo do Dr. Bernardino Marques da Cunha Bastos, falecido em 1910, engenheiro responsável pelos arruamentos da região. A árvore ficava dentro da sua propriedade, que ia até a Rua Japurá, na época chamada de Rua Adelaide, em homenagem à sua esposa.
A região cortada pela Rua Cândido Benício chamava-se nos séculos passados e até início do século XX de Vale do Marangá. Essa várzea é formada a leste pelos morros da Bica, Inácio Dias e da Reunião. A oeste pelo Morro do Valqueire, pertencente à Serra do Engenho Velho: e, ainda, com isoladas elevações conhecidas como Morro da Chacrinha (na Estrada Comandante Luís Souto), Morro Santa Rosa (situado entre as ruas Cândido Benício e Francisco) e Morro do Silveira (na Rua Quiririm). No século XIX, o Morro da Bica (hoje, Fubá) tinha o nome de Marangá.
A palavra marangá vem do tupi-guarani e significa campo de batalha ou lugar de combate. A origem desse topônimo remonta os tempos do Brasil colonial. É possível que alguma das batalhas entre portugueses e índios, estes fugindo do litoral para o sertão, ocorreu na região da Praça Seca. Outra hipótese é sobre a expedição de 1710 do francês Jean François Duclerc, que desembarcou em Guaratiba e fez penosa marcha pelo caminho de Jacarepaguá, onde teve muitas perdas em combates, antes da derrota final na entrada da cidade do Rio de Janeiro. Historiadores afirmam que ele passou pelo local da atual Estrada Grajaú-Jacarepaguá, pois lá foram encontrados, durante sua construção, canhões franceses daquele período. Porém, o francês tinha cerca de mil homens e um guia preto conhecedor profundo de Jacarepaguá. Assim, é viável que Duclerc enviasse outra frente pela atual Rua Cândido Benício, e ali acontecesse lutas de resistência. Talvez, uma das duas hipóteses seja a causa da origem do topônimo Vale do Marangá.
A colonização das terras de Jacarepaguá começou no final do século do descobrimento do Brasil. Após a fundação da cidade do Rio de Janeiro em 1565 por Estácio de Sá, sobrinho do Governador Mem de Sá, e a expulsão definitiva do Francês Villegagnon, outro sobrinho de Mem de Sá governou o Rio de Janeiro: Salvador Correia de Sá. Filho de Felipa de Sá, irmã de Mem de Sá, e de Gonçalo Correia de Sá, ele exerceu o cargo de governador em dois períodos: de 1567 a 1572 e de 1578 a 1598. Quase no final do seu último governo, em setembro de 1594, concedeu aos filhos Martim e Gonçalo duas sesmarias em Jacarepaguá. A sesmaria do Gonçalo Correia de Sá compreendia as terras desde a Barra da Tijuca, passando pela Freguesia e Taquara, até o Campinho. A sesmaria do Martim Correia de Sá era do Camorim até o Recreio dos Bandeirantes, incluindo a grande faixa litorânea. O Gonçalo ocupou sua sesmaria no ano da concessão, fundando engenhos de açúcar. O Martim, ao contrário, dedicou-se a política, inclusive, foi governador do Rio de Janeiro nos períodos de 1602 a 1608 e 1629 a 1632. Por isso, deixou praticamente abandonada a sesmaria de Jacarepaguá. Esses fatos são os responsáveis pela transformação rápida das terras do Gonçalo em complexo urbano, enquanto as do irmão Martim até os dias de hoje ainda têm grandes vestígios rurais.
O topônimo Jacarepaguá deriva-se de três palavras do tupi-guarani: yakare (jacaré), upa (lagoa) e guá (baixa) - "a baixa lagoa dos jacarés". Na época do descobrimento e da colonização, as lagoas da Baixada de Jacarepaguá eram repletas de jacarés, daí o nome. Quando Gonçalo Correia de Sá fundou os primeiros engenhos na atual Freguesia, começou a surgir habitações nas imediações, principalmente onde hoje é a Porta D"Água (Largo da Freguesia). Esse povoado recebeu o nome de Jacarepaguá, em virtude da proximidade das lagoas. Ao passar dos anos, as terras vizinhas também foram chamadas pelo mesmo nome. Nas primeiras décadas do século XVII, a Porta D"Água possuía razoável densidade populacional. Na época, Gonçalo Correia de Sá desmembrou parte da sua sesmaria em foros, surgindo, assim, grandes propriedades. Numa delas, na fazenda do Padre Manuel de Araújo, ergueu-se, também no século XVII, no alto de um penhasco, a Igreja Nossa Senhora da Pena. Com o desenvolvimento do lugar, foi criada, em 6 de março de 1661, a freguesia de Nossa Senhora do Loreto de Jacarepaguá. Essa freguesia foi a quarta do Rio de Janeiro. A primeira foi a freguesia de São Sebastião, instituída no dia 20 de janeiro de 1569, quatro anos após a fundação da cidade. A segunda, em 1634, foi a da Candelária. E a terceira foi a freguesia de Irajá em 1644. A matriz da freguesia de Nossa Senhora do Loreto foi construída em 1664 pelo Padre Manuel de Araújo.
As terras de Jacarepaguá eram ligadas com a freguesia de São Sebastião (atual Centro da Cidade) pelo caminho da Fazenda de Santa Cruz (propriedade dos jesuítas). No século XVIII, a fazenda passou a pertencer à Coroa Portuguesa, quando era governador do Rio de Janeiro Gomes Freire de Andrada, o Conde de Bobadela. Então, o caminho recebeu o nome de Estrada Real de Santa Cruz, cuja denominação durou até 1917, no governo do Prefeito Amaro Cavalcânti, quando seu longo trecho mudou para outras designações, muitas existentes nos dias de hoje: Rua São Luís Gonzaga, Avenida Suburbana (2) , Rua Coronel Rangel (em 1950, mudou para Avenida Ernâni Cardoso), Estrada Intendente Magalhães (em 1962, cedeu parte para a atual Avenida Marechal Fontenele), Avenida Santa Cruz e Avenida Cesário de Melo (nome dado em 1930 a antigo trecho da Avenida Santa Cruz). A Estrada Intendente Magalhães, inclusive, foi trecho inicial da antiga Estrada Rio São Paulo de 1928 a 1950.
Na altura da antiga Fazenda do Campinho, de propriedade de Dona Rosa Maria dos Santos no século XIX, existia um entrocamento, que deu origem ao Largo do Campinho nos tempos coloniais. Esse cruzamento ligava a Estrada Real de Santa Cruz a duas regiões distintas: com a freguesia de Irajá ao norte e com a freguesia de Nossa Senhora do Loreto ao sul, pela antiga Estrada de Jacarepaguá (atual Rua Cândido Benício). Após o Tanque, o viajante seguia pela Estrada da Freguesia (hoje Avenida Geremário Dantas). A Estrada de Jacarepaguá atravessava todo o Vale do Marangá, que por isso também acabou fazendo parte de Jacarepaguá. O vale era passagem obrigatória dos tropeiros e carruagens, que se dirigiam da freguesia do Loreto para Irajá ou para a cidade. O Largo do Campinho estava na rota dos que vinha de São Paulo e Minas Gerais em direção ao Rio de Janeiro. Lá existia famosa estalagem, onde hoje é a garagem e posto de gasolina Rio- São Paulo. Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, pernoitou diversas vezes nessa hospedaria. Inclusive, no dia 9 de maio de 1789, dormiu lá pela última vez, quando se dirigia da Vila Rica (hoje, Rio Preto) para o Rio de Janeiro. No dia seguinte foi preso na Rua dos Latoeiros (atual Rua Gonçalves Dias) e nunca mais retornou pela sua tão conhecida Estrada Real de Santa Cruz. Só saiu da prisão para o enforcamento no dia 21 de abril de 1792.
As duas sesmarias de Jacarepaguá passaram a ter um único proprietário ainda no século XVII. Após a morte de Gonçalo Correia de Sá, a sua mulher e filha, respectivamente, Dona Esperança e Dona Vitória, venderam as terras do esposo e pai, em 1634, para o General Salvador Correia de Sá e Benevides, filho de Martim Correia de Sá e sobrinho de Gonçalo. O general também herdou a outra sesmaria, com o falecimento do pai em 1636. Assim, ele ficou dono absoluto de toda a região, inclusive o Vale do Marangá. O General Salvador Correia de Sá e Benevides, depois da compra da parte do seu tio Gonçalo, passou a morar na casa-grande do Engenho D"Água, que ficou sendo a sede de todas as propriedades. Naquele tempo, Jacarepaguá já estava bastante dividido em foros. Na segunda metade do século XVII, ele fundou, no Vale do Marangá, a Fazenda do Engenho de Fora, situada na antiga Estrada de Jacarepaguá. O engenho de Fora estendia-se pelo lado esquerdo da estrada, do Campinho ao Tanque, incluindo as áreas dos atuais morros da Bica (Fubá), Inácio Dias e Reunião. A sede ficava numa colina atrás do atual IPASE, no Mato Alto. Junto dela, edificada no século XVII, também existia a capela de Nossa Senhora da Conceição. No século XIX, essas construções desapareceram. No mesmo lugar, em 1894, foi construída a Vila Albano por Albano Raimundo da Fonseca Marques, que ainda exista e pode ser vista da Rua Cândido Benício.
O General Salvador Correia de Sá e Benevides faleceu em Lisboa aos 94 anos de idade, em janeiro de 1688, trinta anos depois de ter sido governador geral do sul do Brasil. Deixou as terras de Jacarepaguá para o filho Martim Correia de Sá e Benevides, que foi o primeiro Visconde de Asseca e alcaide-mor do Rio de Janeiro. Mais tarde, no século XVIII, o quarto Visconde de Asseca, também com nome de Martim Correia de Sá e Benevides e neto do General Sá e Benevides, herdou as propriedades. O quarto Visconde de Asseca, nascido em Jacarepaguá em 1698 e falecido em 1777, foi o responsável pelos primeiros vestígios de povoamento da região da atual Praça Seca. Nos meados do século XVIII, foi aberto um caminho secundário para ligar a Estrada Real de Santa Cruz com a Estrada de Jacarepaguá, a fim de diminuir o percurso entre o Engenho de Fora e as terras dos Magalhães, que margeavam as Estrada de Santa Cruz, do Campinho até Realengo. O último dono dessa fazenda foi o Tenente-Coronel Carlos José de Azevedo Magalhães. Em sua homenagem o logradouro recebeu em 1917 o nome de Estrada Intendente Magalhães. Ele foi o candidato mais votado para a Intendência Municipal (atual Câmara dos Vereadores) no ano de 1899.
No ponto da bifurcação do novo caminho com a Estrada de Jacarepaguá surgiu um largo, que recebeu o nome de Largo do Asseca, em homenagem ao dono das terras da região, o quarto Visconde de Asseca. Por metaplasmo popular houve a supressão das duas primeiras letras, e o lugar ficou conhecido como Seca, inclusive também por ter a primeira camada do solo constituída de areia. Mesmo depois de ampliada, a localidade sempre foi chamada de Praça Seca. O caminho que deu origem ao local foi designado, mais tarde, de Estrada do Macaco, em virtude de limitar parte da fazenda do mesmo nome. A Estrada do Macaco pode ser reconhecida hoje em dia pelo seu antigo trajeto: Rua Quiririm, desde a esquina da Estrada Intendente Magalhães até a Rua Luís Beltrão. A partir dessa rua até a Praça Seca. Com a morte do quarto Visconde de Asseca em 1777, as terras do Vale do Marangá (fazendas do Engenho de Fora e do Macaco) passaram a pertencer à família Teles Barreto de Menezes, ancestrais do Barão da Taquara.
Antes de comprar o Engenho de Fora e outras terras em Jacarepaguá, a família Teles Barreto de Menezes era proprietária da Fazenda da Taquara. No século XVII, o dono era Francisco Teles Barreto de Menezes, juiz de órfãos e casado com Dona Inez de Andrade Souto Maior.
No século XVIII, o domínio da fazenda passou pelos descendentes primogênitos até chegar a outro Francisco Teles Barreto de Menezes, bisavô do Barão da Taquara, que morreu no dia 13 de dezembro de 1806, alguns dias depois do falecimento da esposa, Dona Francisca Joaquina de Oliveira Brito, ocorrido em 6 de dezembro de 1806. O casal deixou seis filhos herdeiros: Luiz Teles Barreto de Menezes (avô do Barão da Taquara), Ana Inocência Teles de Menezes, Maria Rosa Teles de Menezes, Catarina Josefa de Andrade Teles, Mariana Penha França Teles e Escolástica Maria de Oliveira Teles. Procedendo-se o inventário, coube como legítima proprietária das terras da Fazenda da Taquara a inventariante Dona Ana Inocência Teles de Menezes. Ela casou-se com João Alves Pinto, que morreu em 28 de fevereiro de 1828. Em 16 de novembro de 1836, também faleceu Dona Ana Inocência Teles de Menezes. Como não teve filho e com os irmãos falecidos, deixou como única herdeira a sua sobrinha Dona Ana Maria Teles de Menezes, filha de Luiz Teles Barreto de Menezes e Dona Maria Felicidade de Gama Freitas.
A Dona Ana Maria Teles de Menezes era casada com Francisco Pinto da Fonseca, português e comendador da Ordem da Rosa. O casal teve dois filhos: Dona Francisca Rosa da Fonseca Teles de Menezes e Francisco Pinto da Fonseca Teles, que mais tarde recebeu o título de Barão da Taquara. Dona Ana Maria faleceu em 31 de outubro de 1840, um ano após o nascimento do Barão da Taquara. Assim, o Comendador Francisco Pinto da Fonseca tornou-se dono absoluto da Fazenda da Taquara e de vários engenhos espalhados em Jacarepaguá, que os antepassados da esposa haviam adquirido através dos anos., inclusive o Engenho de Fora e a Fazenda do Macaco, no Vale do Marangá. O Comendador Pinto faleceu em 23 de fevereiro de 1865, legando todas as propriedades agrícolas para o filho Francisco Pinto da Fonseca Teles, o Barão da Taquara.
O Barão da Taquara nasceu em 25 de outubro de 1839. Quando assumiu a direção da Fazenda da Taquara tinha apenas 23 anos de idade e tornou-se dono da maioria das terras de Jacarepaguá. Possuía muitos engenhos. Os principais, além do Engenho da Taquara, eram o Engenho D"Água e o Engenho de Fora. Desde menino, era assíduo visitante da Quinta da Boa Vista, pois seu pai era guarda-roupa do Imperador Dom Pedro II. Assim, manteve laços fraternais com a família imperial, inclusive o Imperador foi seu padrinho de batismo. Mais tarde, Dom Pedro II frequentou a Fazenda da Taquara, acompanhado da esposa, Imperatriz Dona Teresa Cristina, onde passaram muitas férias anuais. A irmã do Imperador, a Princesa Dona Leopoldina, também se hospedou na fazenda, para se recuperar de doença grave. Em 1864, o Barão da Taquara foi distinguido com o título de Moço Honorário da Imperial Guarda-Roupa. Em 1865, foi nomeado Tenente-Coronel e Comandante do 7º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional, onde atuou durante a Guerra do Paraguai. Pelos relevantes serviços prestados nessa guerra, recebeu o título de Comendador da Ordem da Rosa. O Imperador Dom Pedro II outorgou-lhe o título de Barão da Taquara em 21 de outubro de 1882, por sua dedicação ao povo de Jacarepaguá.
O Barão da Taquara realmente pode ser considerado o Patriarca de Jacarepaguá. Além das terras que doou aos empregados e amigos, ele manteve muitas escolas e consertava logradouros públicos, como aconteceu na antiga Estrada de Jacarepaguá, no Vale do Marangá. Ainda muito jovem, ele casou-se com Joana Maria Penna, com a qual nasceram os três primeiros filhos: Emília Joana, Maria Luiz e Jerônimo Pinto. Cerca de vinte anos mais tarde, em 3 de maio de 1881, esposou Dona Leopoldina Francisca de Andrade, que no ano seguinte passou a ser chamada de Baronesa da Taquara, em virtude do título recebido pelo marido. A Baronesa nasceu no dia 1º de agosto de 1862. Seus pais (José Nogueira de Souza e Ana Teresa de Andrade Souza) possuíam grandes propriedades em Santa Cruz. Foi lá que conheceu o Barão da Taquara, que, além das terras de Jacarepaguá, tinha campos de criação de gado em Santa Cruz. Com a Baronesa da Taquara, nasceram mais dois filhos do Barão: em 1882, Francisco Pinto da Fonseca Teles; e, em1884, Ana Teles. Esta casou-se com Alfredo Rudge e teve três filhos: Francisco José, Elza e Raul. Francisco Pinto da Fonseca Teles, que se formou em medicina, casou-se com a sobrinha Maria Emília Marques, filha de Emília Joana. Desse matrimônio, nasceu um único filho: Francisco Taquara da Fonseca Teles.
O Barão da Taquara faleceu aos 78 anos de idade, no dia 30 de agosto de 1918, em sua residência da cidade, no Largo do Paço (atual Praça 15 de Novembro). No dia seguinte, houve missa de corpo presente na capela da Fazenda da Taquara. À tarde, foi sepultado no Cemitério do Pechincha no jazigo da família. Ao seu enterro, além da grande massa popular, compareceram membros do governo republicano, ministros e representantes da câmaras federal e municipal. As terras da região da Praça Seca, ele legou para os filhos da primeira mulher: Emília Joana, Maria Luiza e Jerônimo Pinto. Para a Baronesa e os dois filhos com ela, deixou as terras da Taquara, Freguesia e do resto da grande planície de Jacarepaguá. A Baronesa da Taquara continuou, durante décadas, com o trabalho filantrópico do marido.. Era chamada de "a mãe dos pobres". Ela faleceu aos 97 anos de idade, no dia 23 de dezembro de 1960. Seu filho, Francisco Pinto da Fonseca Teles, morreu anos antes, no dia 31 de julho de 1955. Sua filha, Ana Teles Rudge, faleceu aos 85 anos de idade, no dia 8 de dezembro de 1969. Atualmente, as antigas terras do Barão da Taquara estão loteadas e densamente povoadas. Mas existem as casas-sedes da Fazenda da Taquara e do Engenho D"Água, que foram tombadas pelo Patrimônio Histórico e pertencem aos seus descendentes. A casa da Fazenda da Taquara fica na Estrada Rodrigues Caldas. A casa-sede do antigo Engenho D"Água situa-se numa colina perto da Cidade de Deus, fim da Estrada do Gabinal e início da Avenida Alvorada.
As carruagens, diligências, tropas de cargas e solitários ou grupos de cavaleiros eram os meios de transportes normais para os habitantes da região da Praça Seca chegar à cidade, através da Estrada Real de Santa Cruz. A partir de 1858, com a construção da Estrada de Ferro Dom Pedro II (rebatizada em 1889, com a Proclamação da República, com o nome de Estrada de Ferro Central do Brasil), o trem passou a ser a melhor opção para essa população. Considerado a grande novidade do mundo do século XIX, o trem possuía velocidade espantosa para a época. Era de vagões de madeira e locomotiva impulsionada a vapor, que foi logo apelidada pelo povo de "maria fumaça". Com a presença do Imperador Dom Pedro II, a estrada de ferro foi inaugurada no dia 29 de março de 1858, inclusive também a estação de Cascadura, a mais próxima de Jacarepaguá. Essa estação ficava exatamente no ponto em que a Estrada Real de Santa Cruz cruzava com a estrada de ferro. Por longos anos, no local existiu uma cancela. Em 1930, no Governo do Presidente Washington Luís, foi construída a atual ponte. A inauguração da estação de Madureira foi anos depois, já na República, no dia 15 de junho de 1890.
O trem de fato revolucionou o modo de vida das populações afastadas do centro da cidade. Antes, só se locomovia para longe, a fim de tratar assuntos importantes ou trabalhar. A partir da chegada do trem, esses habitantes passaram a usá-lo em busca do lazer em lugares distantes. Em 1868, junto à estação de São Francisco Xavier, o Conde Herzberg fundou o Jockey Club. No início, eram realizadas quatro corridas de cavalos anuais, com a presença da família imperial. O povo de Jacarepaguá servia-se do trem, para ir ao hipódromo. O próprio Barão da Taquara, apaixonado pelas corridas, ia de trem com a família. Ele, inclusive, possuía cavalos no prado. Um com o nome de Macaco venceu inúmeros páreos. Em 1884, o Barão participou da fundação do Derby Club, outra entidade do hipismo, juntamente com o Dr. André Gustavo Paulo de Frontin. O Derby Club ficava situado onde hoje é o Estádio do Maracanã. Com a fusão do Jockey Club e Derby Club surgiu o atual Jockey Clube Brasileiro, na Gávea.
O primeiro trecho da estrada de ferro iniciava no Campo de Sant"Anna e terminava no Pouso de Queimados. Alguns trens, porém, só iam até Cascadura e voltavam para a estação do Campo, numa operação giratória vagão por vagão. Mais tarde, no final do século XIX, foi inaugurada a estação de Dona Clara, que acabou com o sistema giratório, pois a linha férrea saia da sua rota normal, para fazer uma grande curva em torno dessa estação, que ficava onde hoje é a Praça Patriarca, em Madureira. Essa estação foi construída na antiga chácara de Dona Clara Simões. Todas as terras de Madureira, do Campinho até a Estrada da Portela, pertenciam a Dona Rosa Maria dos Santos, era a Fazenda do Campinho. Dona Rosa faleceu em 1846. Ainda em vida, dividiu parte da sua propriedade a parentes e pessoas amigas. Uns que receberam lotes foram o inventariante Domingos Lopes Cunha e o amigo de Dona Rosa, Vitorino Simões. Mais tarde, Domingos Lopes casou-se com a filha do Vitorino, a Dona Clara Simões. Em 1937, com a eletrificação da Estrada de Ferro Central do Brasil, a estação de Dona Clara foi desativada, já que os trens elétricos não precisavam dar a volta.
Em março de 1875, o acesso de Jacarepaguá para a estação do trem melhorou bastante, com a implantação dos bondes de tração animal, que partiam de Cascadura e atravessavam o Vale do Marangá, pela antiga Estrada de Jacarepaguá (hoje Rua Cândido Benício). A Companhia Ferro-Carril de Jacarepaguá (como era chamada) foi construída e explorada por Etiene Campos. Primeiramente, os bondes ligavam Cascadura ao Tanque. Depois, houve prolongamentos para a Freguesia e Taquara. Na época dos bondes puxados a burro, a vegetação do Vale do Marangá era muito espessa, e o clima bastante frio. O lugar hoje conhecido como Mato Alto era chamado de Sibéria, no século passado. Inclusive, no inverno, em todo o trecho da Estrada de Jacarepaguá, o nevoeiro era tão denso que nas manhãs, mesmo com sol, era difícil ver do bonde as pessoas na calçada. Na época, quem dirigia o bonde era chamado de cocheiro. Ele conhecia os horários dos habitantes da região, parava nas portas das casas, tocava a sineta e esperava o passageiro chegar.
Em abril de 1911, a Light comprou a companhia de bondes do Etiene Campos. Nesse mesmo ano, eletrificou alguns trechos. Nos bondes elétricos, a pessoa que dirigia é claro que não podia ser denominado cocheiro. Passou a ser conhecido como motorneiro. Quem cobrava as passagens era o condutor.
Em 1912, um ano após a eletrificação, o bonde de Jacarepaguá serviu de cortejo fúnebre do líder republicano, Senador Quintino Bocaiúva. Ele possuía uma chácara no subúrbio, na estação de Cupertino, que atualmente tem o seu nome. A casa ainda existe, numa colina da Rua Goiás, quase em frente à estação. Antes de morrer, Quintino pediu para ser enterrado no Cemitério de Jacarepaguá. O féretro vaio da cidade. Primeiro, no trem da Central. Depois, no bonde de Cascadura até o Pechincha, acompanhado pelo então Presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca. Os bondes marcaram época na região. Antes, só existiam eles. Depois, surgiram os lotações e, a seguir, os ônibus. O bonde 90 era o Taquara. O Freguesia era o 91. Em condições extraordinárias, colocava-se na linha o bonde 89, Largo do Tanque. O Praça Barão da Taquara era o 88 e ia até o Méier, após subir a ponte de Cascadura. Os outros retornavam de Cascadura e faziam o ,contorno num terreno da Rua Nerval de Gouveia. Os bondes de Jacarepaguá foram desativados no Governo de Carlos Lacerda em 1964.
O Engenho de Fora começou a perder sua unidade no princípio da segunda metade do século XIX com a abertura da Estrada do Marangá (hoje Rua Pedro Teles), que cortava grande parte do engenho. Não chegava a ser perfeita paralela à Estrada de Jacarepaguá, pois se aproximava mais de semicírculo em relação a outra. Iniciava na própria Estrada de Jacarepaguá na altura onde hoje é a Rua Capitão Menezes e terminava na mesma estrada onde atualmente se localiza o IPASE. A Estrada de Jacarepaguá, que nos primeiros tempo tinha seu lado esquerdo de ponta a ponta as terras do Engenho de Fora, nos meados do século XIX já possuía grandes áreas desmembradas, que davam fundos para a Estrada do Marangá. No lado direito, se localizava a Fazenda do Macaco, que formava quase um triângulo com as estradas de Jacarepaguá, Macaco (hoje Rua Quiririm) e Real Santa Cruz (hoje Intendente Magalhães).
O primeiro loteamento no antigo Vale do Marangá, em lotes bem menores, foi realizado no início da década de 1890 pelo Barão da Taquara. Foram abertas sete ruas e a Estrada de Jacarepaguá passou a ser chamada de Cândido Benício, homenagem do Barão da Taquara ao amigo e político mais votado nas eleições de 1892 para a intendência municipal, que residia naquele logradouro. Três das novas ruas ficavam perto do Largo do Campinho do lado direito da Rua Cândido Benício, atravessando parte das terras da Fazenda do Macaco: Comendador Pinto, Ana Teles e Pinto Teles. Em 1900, estas ruas foram prolongadas até o Morro da Bica (Fubá). As outras quatro ruas construídas pelo Barão foram: Baronesa, Barão, Emília (hoje Florianópolis) e Albano. Todas terminavam na antiga Estrada do Marangá. As ruas Albano e Emília começavam no lado esquerdo da Cândido Benício, pois os prolongamentos para o lado direito só foram realizados em 1906. As ruas Barão e Baronesa eram as únicas que na década de 1890 atravessavam a Cândido Benício. No meio das duas, também no início da década de 1890, o Barão da Taquara construiu grande praça no lugar do pequeno Largo do Asseca (ou Seca). Naquela época, passou a ser chamada de Praça 25 de Outubro, data do aniversário do Barão.
Entre 1906 e 1909, o Barão realizou outro loteamento no Vale do Marangá, bem mais amplo do que o primeiro, surgindo dezenas de ruas nas fazendas do Macaco e Engenho de Fora. O autor do traçado foi o engenheiro Bernardino Marques da Cunha Bastos, que era sogro do Gastão Taveira e do Januário Acácio (Rei da Banha). O Dr. Bernardino foi negociante de café e delegado de polícia de Jacarepaguá. Em homenagem ao plano de arruamento do Vale do Marangá, o Dr. Bernardino hoje é nome de rua no local. Um ano após terminar o seu trabalho, no dia 9 de outubro de 1910, Bernardino Marques da Cunha Bastos faleceu. Dos novos logradouros, a Rua Capitão Menezes era a maior e se estendia por grande parte da Fazenda do Macaco e Engenho de Fora. Uma parte desse loteamento, o Barão deixou para a sua filha Emília Joana, do Mato Alto até a Rua Capitão Menezes. A outra parte, da Rua Capitão Menezes até o Campinho, para a filha Maria Luiza. O filho Jerônimo Pinto ficou com as terras do Morro da Reunião, no Tanque. Na época do loteamento, todas as ruas eram de barro, inclusive a Rua Cândido Benício, apesar da linha do bonde, que foi pavimentada no final da década de 1920. A maioria, porém, só foi calçada nos anos 50. Na década de 1910, somente três moradores da região da Praça Seca possuíam automóveis: Gastão Taveira, Francisco Albano da Fonseca Marques e Lauro Müller. Num dia de muita chuva e também muita lama, o carro do Senador Lauro Müller ficou atolado na Rua Cândido Benício em frente à fazenda do Capitão Machado. Foi preciso uma parelha de burros para tirar o veículo da lama.
Fonte: O melhor do Bairro
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